sábado, 22 de novembro de 2008

Minas - Milton Nascimento (1975)

Tarefa difícil elogiar um disco de Milton. Não por falta de talento, que acho indiscutível. Grande voz, sempre bem acompanhado, repertório com diversos clássicos, e por aí vai. O problema é que ele ficou chato, virou uma mala sem alça. Obviamente que falo do artista, pois a pessoa é tão doce e tranquila que acho que qualquer um gostaria de bater um papo, trocar uma idéia. Ele, portanto, está longe de ser um Ivan Lins, porque aí também não dá, o cara é quase imbatível, sendo que eu tô dando o benefício da dúvida, porque não conheço ninguém mais chato.

Mas voltando a Milton, depois que ele virou menestrel, cantou pra Tancredo, aquela super exposição, as músicas, sei lá, perdi a paciência e aí acabei esquecendo que o cara teve uma produção excelente antes disso. E por isso, não foi sem surpresa quando fui apresentado a este disco.

Minha reação inicial foi de desconfiança natural, “O mala do Milton?”, mas o disco já começa conquistando de cara com Paula e Bebeto, música incidental que abre e fecha Minas. Linda, com coro de amigos, coral de meninos, vocalizes de Milton, que acompanha tudo com o violão. E mais nenhum instrumento. Bonito demais! Curioso é que Paula e Bebeto, além de seu momento solo, também faz participação especial/incidental em Idolatrada e Saudade dos Aviões da Panair.

Saudade que é palavra chave no disco (e talvez em toda a arte de Milton), porque o disco não é sobre Minas Gerais, mas sobre a Minas de Milton, desde a sua infância no interior à BH do Clube da Esquina, dos Beatles, dos amigos, que em cada música é evocada em imagens, símbolos e lembranças levemente melancólicas, saudosistas, com um quê de triste. Que nem em Ponta de Areia, mais um hino ao passado, lembranças de um lugar e um tempo que não existem mais.

E referências, há várias, como a música sacra, trazida pelo coral, e que fez parte da infância de Milton e mesmo de sua formação como cantor; ao barulho de trem, em Gran Circo; além de vocalizes de Beto Guedes, seu velho parceiro e amigo, que também divide os vocais em Fé Cega, Faca Amolada. E há outros, como costumava ser entre eles: Wagner Tiso em vários teclados e na produção, Nivaldo Ornellas nos sopros, Toninho Horta na guitarra (em excelente forma, às vezes límpida, às vezes torta), todos eles artistas com produção individual respeitada, mas com a humildade de saber ser coadjuvante, ainda mais num disco que preza a simplicidade nos arranjos.

Arranjos que são um dos destaques do disco. Simples, mas sofisticados, essa mistura difícil é típica dos discos de Milton, que conseguiu grandes resultados nos anos 70. Isso fica claro em Norwegian Wood, dos Beatles, que ganha uma versão com belos vocais, divididos com Beto Guedes, uma banda, com guitarra, baixo, bateria e teclados, além de uma orquestra que consegue dar um ar dramático sem cair na suntuosidade. Desde o início percebe-se que é uma música familiar, mas demora até cair a ficha, mérito do trabalho de recriação de um clássico.

Milton produziu grandes discos e este sem dúvida é um deles. Daqueles que, mesmo quem, como eu, não é fã, gostam. Daqueles que são bons, mesmo transbordando todos aqueles clichês de Minas, da vaquinha, o morrinho, o riozinho, o trenzinho. É prova de que não se deve ter preconceitos na arte, para não corrermos o risco de perder belos momentos como os deste disco.

Luiz Marcelo

7 comentários:

  1. Belo post, Luma! Apesar de tê-lo roubado de mim, eu queria resenhar este só por causa de Fé Cega, Faca Amolada que, escute a banda!, merecia atenção especial... [MATEUS]

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  2. A banda de fato é um show parte. Sem falar nos arranjos. Mas falo da banda no mesmo parágrafo que FC/FA, dentre outras coisas por causa disso. Mas realmente poderia ter "exagerado" mais nos elogios. Poderia ter chamado a atenção do leitor, na linha "músicas fundamentais", pra ouvir com cuidado.
    Valeu!
    LM
    PS: você me roubou Fruto Proibido, mas como disse, acho que não faria melhor. Mas prometo postar alguns comentários lá.

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  3. Tá (bem) pago, então... [M]

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  4. Se não gosta tanto pra que perder tempo?

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    1. Pois eh, mas desse disco eu gosto bastante. E eh um classico, merece uma atencao.

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  5. Você não gosta de Milton mas eu gosto. Certo que ele ficou meio chato ou muito chato depois de Caçador de Mim e "Coração de Estudante", mas esse seu texto ficou tão bom que me deu vontade agora de ouvir o disco mais uma vez.

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    1. Pô, valeu. É um texto meio torto, né? Bate e assopra. Depois de um tempo eu descobri que não gosto de artistas, mas de discos. E este é um deles.

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