domingo, 29 de março de 2009

Barão vermelho, o primeiro (1982)


E pensar que a dupla Cazuza & Frejat (‘o mais próximo de Jaggers & Richards que o rock brasileiro jamais chegou. Feitos um para o outro’ conforme Arthur Dapieve) só começou a nascer devido a um fracasso do grupo, um show furado na feira da Providência, no qual a produção não providenciou amplificação...
De posse de uma fita demo, Ezequiel Neves (um Barão de fato) convenceu Guto Graça Mello de que tinham boa coisa em mãos. Difícil foi convencer o diretor da Som Livre, João Araújo, pai de Cazuza. Mas assim foi.
A gravação do primeiro álbum foi tumultuada, muita gente no estúdio, Cazuza muito doido tendo problemas no andamento. Mas salvou-se, e foi lançado em 27/09/1982, um dia depois de ‘As aventuras da Blitz’.
Mal gravado, mas com muitas qualidades. Aproximava-se do amadorismo no melhor sentido, músicos inexperientes e muita vontade.
Afinal, um disco que tem ‘Todo amor que houver nessa vida’ necessariamente é um clássico.

‘Ser ter pão, ser tua comida
Todo amor que houver nessa vida
E algum trocado pra dar garantia
E ser artista no nosso convívio
Pelo inferno e céu de todo dia
Pra poesia que a gente não vive
Transformar o tédio em melodia’

Depois Caetano tocou essa música no show de seu disco ‘Uns’, elogiando Cazuza e criticando as rádios que não tocavam o Barão. Havia aí um pedido de desculpas ao enciumado Cazuza que jogou uma mesa pro alto ao ver Caê se desmanchando pelo seu namorado...mas isso está parecendo Caras.
Mais tarde, com mais uma benção da MPB – Ney Matogrosso (ex namorado de Cazuza, olha a Caras aí de novo) gravou ‘Pro dia nascer feliz’, finalmente o Barão seria tocado nas rádios.

O Barão era formado por 4 colegas dos cursos de música da Escola Pro Arte: Guto Goffi, Maurício Barros, Frejat e Dé. Chamaram Leo Jaime pra cantar que, achando o grupo ‘esporrento’ demais, indicou Cazuza.
Os caras, como bem definiu Ricardo Alexandre, ‘conseguiam, instintivamente, encontrar um elo perdido entre o blues americano e as canções de dor-de-cotovelo de Dolores Duran, entre os gritos hippie de Janis Joplin e o resmungo tosco do punk; fazia a ponte entre os riffs herdados dos Rolling Stones e a esperteza das esquinas cariocas. E as letras uniam a marginalidade cosmopolita de Lou reed à boemia de Lupicínio Rodrigues’.
Finalmente A Banda de Rock brasileira. Ou conforme o citado Ezequiel Neves ‘rock sem frescura, sem nada de bem-comportado, garagem mesmo’.

Mas vamos às músicas:
‘Posando de star’ inicia bem, com uma bateria e o vocal característico do Cazuza, depois vira um rock básico e animado.
Aí o álbum cresce, ‘Down em mim’ é uma belíssima balada, pena que pouco executada. Letra típica (‘da privada eu vou dar com a minha cara de panaca pintada no espelho e me lembrar sorrindo que o banheiro é a igreja de todos os bêbados’) e bonito solo blues de guitarra limpa do Roberto Frejat!
‘Conto de fadas’ mantém o pique, e ao contrário da inspiração citada de fossa, mostra que a solução dessa geração era diferente. Se não deu certo, segue a vida.
‘Billy Negão’ estava na demo original, legal, animada, bem-humorada.
‘Certo dia na cidade’ começa instrumental, depois fica meio igual, mas dá uma mudada e vem mais um solo inspirado.
‘Rock’n’geral’ segue no pique, com solinho de teclado e tudo, uma declaração de princípios.
‘Ponto fraco’ é uma das melhores do disco, arrastada e malandra, uma letra que diz tudo (‘todo mundo tem um ponto fraco, você é o meu, por que não?’). Depois eles regravaram no ‘Ao vivo’, mais pesadona.
‘Por aí’ é mais uma declaração de princípios doidona, ouça e descubra de novo...
‘Todo amor que houver nessa vida’ dispensa comentários, poesia e rock’n’roll ao extremo.
E aí fecha com chave de ouro: ‘Bilhetinho azul’, tchu tchu tchuru.
(Dão)

sexta-feira, 20 de março de 2009

Tim Maia, Descobridor dos sete mares, 1983



Depois da inclusão de diversos intérpretes e músicos entre os 1001 discos nacionais, torna-se questão de justiça citarmos algum disco (qualquer que seja) do nosso “síndico” Tim Maia. Uma das figuras mais célebres da música brasileira.

A dificuldade inicial é a escolha de um disco para citar aqui nesse blog. Um que pudesse representar dignamente a sua obra. Uma opção mais fácil seria citar algum Racional (dois volumes lançados, além de um terceiro que não chegou a ser lançado), muito em voga hoje em dia. Entretanto, seria injusto com o próprio Tim Maia, já que ele mesmo renegou posteriormente esses trabalhos feitos em uma fase careta, com letras ligadas à estranha seita que ele aderiu durante um curto período. Esses discos, embora tenham o seu valor, não servem ao propósito de retratar a carreira e a personalidade do Tim Maia.

Para mim, é importante citar um disco em que suas características marcantes estivessem mais que presente, ou seja: a polêmica, o vozeirão, o suingue, o romantismo e os metais da banda Vitória Régia, que sempre o acompanhava. Diante disso, optei por Tim Maia – Descobridor dos Sete Mares, de 1983. Trata-se de um disco com a cara dele, com seus dois estilos marcantes (funk e românticas), cada um ocupando um dos lados do vinil.

Começa com a música título do disco, um de seus maiores sucessos, que estourou nas rádios e tornou-se uma das músicas marcantes da década de 1980. “Pois bem cheguei, Eu quero ficar bem a vontade na verdade eu sou assim”.

Em seguida, Tim Maia arrebenta com “Terapêutica do Grito”. Uma música que tem a sua cara e a sua energia. Além disso, me faz recordar festas no tempo de Unicamp, já que era um dos sucessos do Álculos Escuros, um grupo formado por alguns amigos naquela época. Recomendada para acabar com qualquer estresse. Escutem.

O soul e funk que predominam nas primeiras músicas mantém-se em "Pecado Capital". Embora menos conhecida, é uma “loucura legal muito perto do prazer de ser”. Esse lado do disco termina com outras duas que também têm nos metais o seu forte, embora menos famosas: “mal de amor” e “3 em 1”.

No lado B do vinil, momento para rosto colado e música lenta. Aqui os metais e o funk cedem espaço ao romantismo, a começar com “Neves e Parques”: "comprei uma passagem no primeiro avião..voltei!".

Depois de outra romântica ("Rio Mon Amour"), Tim Maia vem com “Me dê motivos”, composição da dupla Sullivan e Massadas que marcou sua carreira. Trata-se de uma balada romântica clássica, que começa com ele narrando uma história com alta dose de dor de cotovelo. Até mesmo quem tem preconceito com música romântica (eu mesmo tenho um pouco), se emociona ao ouvir essa interpretação. “Me dê motivos... pra ir embora...estou vendo a hora...de te perder...”. Definitivamente, é nessas horas que um homem chora.

O disco termina com outras duas românticas de menor destaque: “Olá (emoções)” e “Essa dor me apanha”.

Enfim, trata-se de uma das obras do Tim Maia que sintetiza melhor o que ele foi e o que representou para a música brasileira. Figura ímpar no cenário musical que deixou muitas saudades. Felizmente sobraram seus registros musicais de 32 discos em 28 anos de carreira. Com a firmeza e os lampejos do farol. [Paul]

quarta-feira, 18 de março de 2009

REI!!!!!!!!!!!!!

Tem esse disco aí que é uma jóia, mora?

Até conhece-lo, e sendo fã do homem, vivia crente que ninguém cantava as musicas dele melhor que o próprio. Esse disco me fez mudar de idéia.

Como hoje todo mundo diz que idéia é projeto: esse foi um projeto que deu certo. Pegaram um monte de cantor pop da época e distribuiu-se algumas músicas do Roberto entre eles.

Quer coisa mais simples? Quem não gostaria de gravar uma musica do Rei? E que apelo melhor que colocar os pop’s da época? E o bacana é que quase todas as faixas deram certo!

É claro que tem aquelas sofríveis e que só nos dão o trabalho de ter que programar o cd para não toca-las. São: É Proibido Fumar - Skank, Por Isso Corro Demais - Marina Lima e Eu Sou Terrível - João Penca e os Miquinhos Amestrados. Mas, no meio de treze músicas o prejú não é grande.

Disco altamente recomendável para constar de qualquer “kit praia versão básica” de um solteiro da época: Rocambole Beach (toalha grande com recheio de um calção e duas cuecas) + Saco Americanas Summer (um Bukoswki qualquer, Dorflex, descongestionante nasal e o disco). Era sucesso garantido!

E tem até uma história ou mito interessante. No encarte interno tem um desenho do Angeli com todos as bandas caricaturadas...e um espaço em branco não ocupado por algum cantor qualquer. Dizem que era para ser o Lulu Santos na musica “quero que vá tudo pro inferno”.

Acontece que o Roberto Carlos não permitia mais ninguém falar coisas como inferno. O tal do TOC dele, sabem?. Assim não permitiu a faixa. Uma pena! Naquela época o seu ridículo tinha uma desculpa séria, depois disso ele só foi e é patético puro e simples mesmo com o seu quepizinho de capitão de navio “C” por aí.

Desabafo desnecessário de um fã à parte, o disco merece estar por aqui.

(ZEBA)

sábado, 14 de março de 2009

Chico Buarque - Construção (1971)



Acho que a demora em aparecer a resenha de “Construção” nesse blog decorre da imensa responsabilidade dessa tarefa. Trata-se de um clássico absoluto, obra obrigatória em qualquer lista que se tem notícia, inclusive um dos poucos nacionais citados na publicação “1001 Discos para Ouvir antes Morrer”, que nos inspirou. De minha parte, esperei surgir uma motivação extra que pudesse servir de inspiração, algo que ocorreu nessa semana.

Entretanto, ciente de que não há inspiração que dê conta da grandiosidade dessa tarefa, vou logo avisando que não tenho pretensão de escrever algo original sobre essa obra-prima mas simplesmente incluí-la aqui.

Lançado em 1971, com músicas composta em seu período de auto-exílio na França, esse disco marcou a entrada do Chico Buarque em uma fase mais contestatória em relação à ditadura militar, a começar com “Deus Lhe Pague”, faixa que abre o disco com um ritmo alucinante, influência dos arranjos de Rogério Duprat: “Por esse pão pra comer, por esse chão pra dormir, A certidão pra nascer e a concessão pra sorrir, Por me deixar respirar, por me deixar existir, Deus lhe Pague”.

Em seguida, “Cotidiano” marcou um dos maiores sucessos de toda a carreira do Chico
“Todo dia ela faz tudo sempre igual
Me sacode às seis horas da manhã
Me sorri um sorriso pontual
E me beija com boca de hortelã”

“Desalento” é a das quatro compostas em parceria com Vinícius de Moraes, não por coincidência, uma das mais românticas desse disco: “corre e diz a ela que eu entrego os pontos”.

A quarta - faixa-título do disco - é um caso à parte. Estruturada em apenas dois acordes, com 41 versos dodecassílabos, terminados todos com proparoxítonas, essa canção narra a vida de um pedreiro sem perspectivas, destinado à morrer na construção civil. Elaborada em duas partes, uma antes e outra depois da morte do protagonista, Chico transforma o todo o sentido com uma simples alternância das últimas palavras de cada verso. Outro detalhe interessante refere-se ao aumento gradual da sonoridade, com entrada de instrumentos ao longo dos versos até a conclusão sinfônica que emenda com “Deus lhe Pague”.

Ninguém vai me acorrentar Enquanto eu puder cantar....Enquanto eu puder sorrir. Em “Cordão”, Chico Buarque lança mão mais uma vez de metáforas inteligentíssimas para criticar o regime e driblar a censura que tanto o perseguia naquela época.

Depois de “Olha Maria”, música em que Tom Jobim participa com o toque característico de seu piano, Chico vem com “Samba de Orly”, outra que se tornou um clássico do período de exílio (Orly é o aeroporto de Paris): “vê como é que anda aquela vida-à-toa e se puder me manda uma notícia boa”.

Na seqüência, Valsinha (outra em parceria com Vinícius) conta uma bela e feliz história de um encontro. Uma canção de amor, para amar, que acabou tornando-se mais um grande sucesso desse disco.

“Ele vinha sem muita conversa, sem muito explicar...”. Se em outras canções, Chico Buarque conseguiu driblar a censura, em “Minha História”, não teve a mesma sorte. Trata-se de uma versão da canção italiana Gesubambino, que a censura não deixou que tivesse o nome de Menino Jesus.

Dorme minha pequena não vale a pena despertar... Para fechar o disco, Chico nos surpreende com uma linda canção de ninar, daquelas que dá vontade de cantarolar quando se vê uma criança (ou uma mulher amada) dormindo como um anjo.

Enfim, o disco é tão bom e já foi tão descrito que dificilmente eu conseguiria ser original. Mas estava mais que na hora de incluí-lo nessa lista.

Coincidência ou não, o período em que Chico Buarque mais tinha problemas com a censura foi quando compôs, na minha modesta opinião, suas músicas mais inspiradas. Que esse disco sirva de inspiração para a vida de todos! [Paul]