Domingão, dia nacional do churrasco, do futebol à tarde e, no Rio De Janeiro (saudade!), dia de pagode, ou melhor, Partido Alto, mais elegante como merece nosso Embaixador dos morros e favelas, Bezerra da Silva.
O disco aqui começa com uma homenagem 'aqos morros de cá e de lá', no caso, da cidade do Rio e também de Niterói, 'Aqueles morros' cita muitos dos morros (ou comunidades, como se diz hoje de modo politicamente correto). Com carinho especial ao Morro do Cantagalo, lugar de moradia do nosso herói. Esta música é uma das poucas de autoria do Bezerra (co-autoria de Pedro Butina), que quase sempre garimpa e interpreta músicas de autores desconhecidos, com nomes muito diferenciados: Barbeirinho do Jacarezinho, Trambique, Adelzonilton, Criolo Doido, Bizum etc.
'Apertar o cinto' pra onde? "Se já não tem mais lugar, estou com a barriga nas costas, não sei onde vou parar". Bezerra foi mendigo nas ruas de Copacabana durante sete anos, chegando a tentar o suicídio. Ele sabe do que está falando.
'Na aba' é uma clássica do disco. "Não nasci pra coronel, saia da aba do meu chapéu/ Na aba do meu chapéu você não pode ficar/ meu chapéu tem aba curta/ você vai cair e se machucar".
'Deixe uma páia pro véio queimar', você deve saber sobre o que ele está cantando, mas é também sobre descarregos, malandros, otários e vaciladores em geral. Mas "Vovô é cabeça feita e não atrasa ninguém".
'Amigo do sereno' fala sobre Leonor, que quer morar com o autor mas não sabe quem ele é, um boêmio partideiro que "pra chegar não tem hora". E cheio de exigências...
'Cipó cabloco' serviu pra amarrar nego no toco e traz até uma viola discreta naquela conhecida massa sonora do samba, além de um berimbau esperto no meio.
'O federal' é um cara bem considerado, malandro no sentido mais elegante, afinal "cobra criada não pega sapo no chão/ ela não arma bote pra nada/ só come o que vem na mão". O federal "onde chega ele é bem chegado/ vê tudo e não vê nada/ tem boca e fica calado/ respeita malandro e mané/ só fala na hora certa/ não tem medo da madrugada e não acredita em sugesta". Sabia tudo o Bezerra!
Em seguida 'Vizinha faladeira', figura conhecida e letra auto-explicativa. "E o coitado do marido ainda morre de amores por ela"...Coral feminino em resposta, clássico. Põe mais lingüiça aí, magrinho!
'Punhado de bambas' fala sobre o bairro de Madureira, com seu característico carnaval festivo e seus muitos compositores, além de pontos conhecidos dos moradores do bairro. "A Portela e o Império Serrano moram em madureira também".
'Chico não deu sorte' é sobre o tal Chico que "está quase à morte no Souza Aguiar", hospital do Rio, devido a algo que teria comido, um cozido ou pó da china (?). Mas é mentira conforme Bezerra vai esclarecendo, na verdade tomou uma surra...porque, ninguém "na Colina" pode falar.
'Vovó D'Angola' é sobre umbanda/candomblé, religiões afro-brasileiras que o nosso intérprete abandonou em 2001 convertendo-se evangélico. "Bate tambor"! E manda a alcatra pro fogo que o arroz já vai ficar pronto.
A vida atribulada do sambista intérprete virou livro 'Bezerra da Silva - Produto do morro', que inclusive eu ganhei do amigo e colaborador Paul.
Mais pro fim da vida (Bezerra morreu em 2005, faz uma falta danada em tempos politicamente corretos de muita bundamolice), teve um reconhecimento da geração mais nova, como Planet Hemp, Rappa, Velha Virgens, inclusive gravando com estes citados.
Declarava-se um bom malandro e não queria, por isso, morrer numa sexta-feira e atrapalhar a praia dos amigos - morreu numa segunda-feira, 17 de janeiro. 17/1, ou como percebeu o amigo Dicró, 171!
"Malandro é malandro e mané é mané".
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