segunda-feira, 20 de outubro de 2008
Um Anticomputador Sentimental (Caetano Veloso 1969)
Selecionar um ou outro disco do Caetano Veloso para compor essa seleta lista não é das tarefas mais fáceis. Entre tantas obras primas, já foram citados o “petardo” Cê (Dão) e Cores Nomes, um “caetano sem gelo e limão” (Mateus).
Como bom gosto não se discute, mas se compartilha, vou dar minha contribuição, incentivado pelo recente show que tive o prazer de assistir no Municipal na semana passada.
Trata-se de “Caetano Veloso”, de 1969, disco que conheci ainda na infância graças ao bom gosto musical da Nati, minha irmã.
Pessoalmente, creio que foi uma versão tropical do conhecido “álbum branco” dos Beatles, lançado menos de um ano antes desse, a começar pela capa igualmente branca (apenas assinatura do músico - pode não parecer, mas a capa está no início do post), passando pela ausência de um nome, até sua própria configuração, com músicas aparentemente contraditórias que travam um interessante diálogo. Mais do que influência, o disco do quarteto de Liverpool pode ter servido como inspiração.
O disco abre com a irreverente “Irene”, que de modo perspicaz, reproduz, ao som da guitarra, a famosa risada que ele tanto queria ver (homenagem à sua irmã). Reparem...
Depois, a melancólica “Empty Boat”, talvez uma das primeiras composições de Caetano em inglês. Embora pouco conhecida, seu belo arranjo consegue transmitir um vazio existencial que tão bem se encaixa em certos momentos da vida (duvido que alguém já não tenha sentido).
O ritmo volta a ficar alegre com o faceiro “Marinheiro Só” com seu bonezinho, repetindo a fórmula nas músicas seguintes: “Lost in Paradise” (outra composição em inglês, na sua preparação para o exílio) seguida pela carnavalesca “Atrás do Trio Elétrico” que dispensa comentários. Só não vai quem já morreu.
O fado lusitano se faz presente com “Argonautas”, que trouxe para camisetas do Brasil todo a frase Navegar é Preciso Viver não é preciso. Ao contrário de que muita gente pensa, o sentido que Fernando Pessoa empresta ao termo “preciso” não tem nada a ver com necessário, mas sim com exatidão. Seria a contraposição da navegação (com regras da ciência exata) com a vida (cujo fim ninguém conhece). Era Caetano às vésperas do exílio.
Na seqüência, interpretação da bela “Carolina” de autoria de Chico Buarque.
Eu bem que avisei, vai acabar, de tudo lhe dei para aceitar
Mil versos cantei pra lhe agradar, agora não sei como explicar... só Carolina não viu.
Sensivelmente bela e ao mesmo tempo triste, parece que essa música serviu de inspiração para o batismo de tantas “Carolinas”, que certamente procuram outro destino.
O disco segue com tempero argentino no tango “Cambalache” para emendar com a belíssima “Não Identificado”, uma canção dizendo tudo a ela, que ainda está(ou) sozinho, apaixonado... uma canção de amor! De tão linda, essa música foi gravada e regravada várias vezes (Gal, Bethânia, etc), cada um com uma levada diferente, mas igualmente líricas. No youtube tem um depoimento da mana do Caetano seguida de uma interpretação que faz marear os olhos (http://www.youtube.com/watch?v=sJN_a8dy7kU),
E caso canção de amor não identificado não fosse suficiente para abrir olhos de Carolinas, Caetano não poderia ter se saído melhor na seqüência: Podemos ser amigos simplesmente... coisas do amor nunca mais, interpretando Chuvas de Verão, de Fernando Lobo. Momento sublime.
Para finalizar, quero o que não mereço....o começo, a poesia “Acrilírico”, com a participação do maestro do tropicalismo Rogério Duprat, seguida de “Alfômega”, do amigo Gilberto Gil, que deve ter servido de inspiração para que outro baiano – Carlinhos Brown - fizesse o também elogiado “alfagamabetizado” cerca de 25 anos depois.
Enfim.... só escutando mesmo todo o disco para sentir como essa profusão de estilos, ritmos e línguas que interliga um ie-ie-ie romântico com Carolina dos olhos fundos, passa de trio elétrico para o empty boat e mistura tango com fado produz um resultado tão genial.
[PAUL]
Segue link para baixar o disco: http://link-protector.com/176329/
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