sábado, 25 de outubro de 2008

Full Moon (Infernal - Nando Reis - 2002)



Todo mundo tem seu mundo secreto. Confesso que o Nando Reis é um personagem que há muito passeia pelo meu… Adoro sua voz rústica e desafinada, seu cabelo vermelho, sua barba, seus brincos e anéis, seu jeito de tocar o violão e principalmente o jeito que ele escreve e canta o mundo pra gente.

Me liguei no Nando através da voz da Cássia Eller em “Luz dos Olhos”. Pensei: nossa, o que é isso?! E fiquei tempos viajando naquela música, naquele fusca, naquelas malas, naquele amor tão intenso. Pirei.

Taí, o Nando é uma figura barroca, intensa, angustiada, sempre cindido, sempre buscando o amor. Transita entre o sim e o não num movimento pendular e o mais legal, entre o seu sim e o seu não, muitas estórias acontecem. Sua poesia tem temperatura, exala calor e se tivesse uma cor, seria o vermelho. NR nos toca porque ele escancara nossas dúvidas, canta com naturalidade aquilo que a gente guarda a sete chaves nas nossas gavetas.

“INFERNAL” (2001) foi meu primeiro disco do Nando. O encarte é uma obra de arte! Aquela boca cantando, aquele pé no ritmo, aquele pullover são de matar! O amarelo das paredes, o baquinho de madeira naquele canto, o sol redondo e opostamente sua alma gêmea, a lua… Bicho, eu adoro! E do outro lado, atravessando a porta sempre aberta, você se depara com a full moon… Bom, depois desse encarte a melhor coisa é logo se entregar pro recheio do disquinho. Aliás, é isso que o Nando faz com a gente, ele te convoca a mergulhar no seu mundo amoroso cheio de atalhos, de armadilhas e de prazer. Eu não sei exatamente o que mais me atrai na música dele. Será a força da realidade, será a energia estonteante dos sons, será a velocidade do seu ritmo ou será sua poesia escandalosa com a qual me identifico profundamente? Não tenho a minima idéia, talvez seja tudo isso junto, como num ímã.

Nando começa como uma bomba em “Infernal” e num reggae rasgado ele grita “Eu juro, eu te amo desde que eu nasci”. Pode alguém jurar um amor desse tamanho? O mundo que até então cabia num criado-mudo e aí chega você, estilhaçando, ampliando tudo. Infernal. O Nando canta o amor como uma possibilidade de libertação. É um abre-te sésamo! Tudo vale entre o céu e o chão.

“ECT” chega com um batuque redondo, gostoso, com umas interferências de quintal ao fundo, com uma guitarra graciosa e brincalhona. A carta é de amor, um susto! Uma carta que te convence a aparecer no mundo. Aqui estão os Tribalistas às avessas! Num jogo de cadeiras sai o Arnaldo e entra o Nando. No final um silêncio para um breve respiro. O resultado é uma música com a velocidade da luz.

“A Minha Gratidão é Uma Pessoa” canta a dor e a delícia do perdão. Começa lenta e ganha força, como se o Nando quisesse nos convencer que sim, que vale a pena tentar. A palavra mágica é a imperfeição, ele celebra a nossa condição de amar , desamar e reamar. A música fecha com a guitarra insistente, seguida de uns sons ondulares, insinuando paz.

O céu arde com “O Segundo Sol”. A invenção fica linda na voz do inventor. A guitarra ganha voz e o Nando calmamente recita a força do inesperado. Essa lindeza para mim é uma incógnita. Uma incógnita que me tira do sério, me incomoda pela sua beleza, pelas suas palavras inusitadas e amarradas numa trama impossível. "O Segundo Sol" é um knockout.

Acho o máximo a despretensão de “A Fila”! O balanço dessa música é inconfundível! A feira como um espaço de encontro delicioso: tem pastel, tem bolachinha, tem morango, tem gente trançando, tem gente gritando, tem gente experimentando. A feira tem cheiro, tem personalidade. O Nando imprime nas coisas cotidianas a poesia. Na feira “eu procuro o mais barato pra sobrar dinheiro para comprar muitas flores para você”. NR é um poeta incansável, ele não desiste do amor. Essa é a sua língua.

A mais linda de todas, “Os Cegos do Castelo”. Nessa música o Nando pede água.
“Eu cuidarei do seu jantar/ do céu de do mar/ e de você e de mim”. A potência amorosa dessa música é transcendente e de novo o Nando chega de mansinho, nos contando de como é o mundo no nosso porão e do desejo de escapar pela porta aberta, para o sol lá fora. É a esperança do reencontro, da chance, de quem tá desejando de corpo e alma, de novo, mais uma vez. O Nando é isso – essa sequência de amor e desamor, essa tensão humana dos erros e acertos. É uma música de carne e osso. Nua e crua.
O final é avassalador, NR sai de cena e deixa só a música, nos permitindo o olhar fixo para cegos que habitam a nossa escuridão.

Esse cd é sem fim! Um bumerangue, vai-volta-vai-de-novo e volta-com-mais-força. “Resposta” – “Bem mais que o tempo/ que nós perdemos/ ficou pra trás, também o que nos juntou”. É o lugar vazio do amor , do passado, daquele que continuou andando apesar dos versos seus, tão meus. Acho essa música um carinho para os ouvidos, uma cosquinha boa de ouvir. É serena. É um Nando menos desesperado, literalmente numa onda peace & love.

“Onde Você Mora” abre com uma guitarra quebrada, com uma melodia super sensual. Aqui a música e a poesia foram criadas num encaixe perfeito. Uma música feliz, “com a sorte de um amor tranquilo”, um amor inesquecível, num desses delírios que a gente não quer nunca mais esquecer. Privilégio um amor desse! Amor que não se mede/ amor que não se pede/ não se repete”… Ah, que covardia!

Em “Fiz o que Pude” e “Me Diga” o Nando volta visceral, tomado pelo desespero de ver seu amor escorrendo pelas suas mãos. É um NR dando uma chance para ele mesmo, em “Fiz o que Pude” de uma forma frenética e em “Me diga” de uma forma maior, onde todos seus amores entram em cena – o pai, os filhos e a mulher amada. “Me Diga” é linda, porque aqui Nando mais uma vez reconhece seus limites, ele canta os limites do próprio amor. É um alívio o sentimento dessa frase “E eu/ dependo do que eu não entendo/eu pretendo apenas/que você saiba que isso é o meu amor”.
Ele saca como é super não ser super-herói. Maravilhoso.

Então tá, acho impossível não ouvir o Nando e não se enxergar em sua poesia, não fantasiar um small world com suas palavras. Não tem saída: é como num espelho: ou você se enxerga na sua obsessão ou na sua paixão.

Esse pequeno texto é dedicado ao PQ, linda fantasia que virou realidade, ao Obama, fantasia de mudança por que torço com todas as minhas forças para que também se torne realidade e ao Mateus, que há muito tempo me disse assim: escuta o Nando, acho que você vai gostar. Ele tinha razão!
[ANDRÉA]

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