quarta-feira, 22 de outubro de 2008

Contato, contato (O dia em que faremos contato - Lenine - 1997)


Começamos aqui a falar sobre a obra de um artista não ligado a nenhum movimento, assim como, ele mesmo gosta de citar, Djavan, Tim Maia, Jards Macalé etc. Ele prefere a palavra movimentação.
Lenine é o nome dele, e ‘O dia em que faremos contato’ o nome do disco. Não é o primeiro, mas ‘Olho de peixe’, com Marcos Suzano (que também participa desse disco aqui comentado), é dificílimo de encontrar, pra quem ainda compra cds como eu. ‘Baque solto’ é um disco coletivo que pouquíssimo tem a ver com este aqui.
O disco começa com ruídos não musicais, um fax conectando, uns meninos (Caju e Castanha) contando sobre sua vida de artista de rua – que depois são sampleados no meio da música. De repente, por trás de um barulho sintetizado rítmico, surge a voz poderosa de Lenine, cantando e ‘rapeando’. ‘A ponte’ não podia ser melhor pra iniciar o disco, impressionante, moderna e com pressão.
Já li ele dizendo em algum lugar que se aproximou da música não pela MPB, e sim pelo rock (Led Zeppelin foi o nome que li). Talvez por isso eu goste tanto do seu trabalho. A pegada é rock, a sonoridade é caprichada, mas tem balanço, vozes agradáveis e letras belas.
Como é a pop ‘Hoje eu quero sair só’, com uma harmonia que se repete a música toda (mas não é repetitiva), um solinho de guitarra wah-wah esperto (cortesia do sempre preciso Fernando Vidal), um pandeiro meio escondido, uma guitarra eventual suingada e aquele violão excelente que marca muitas de suas músicas, além de várias vozes sobrepostas.
Depois, a minha favorita, o baião heavy ‘Candeeiro encantado’. Mesmo sem guitarras pesadas (que eu teria colocado), tem a pegada e a estrutura inspirada em blues, mas com a rítmica e letra de repente. Mistura bem timbres eletrônicos, violão legal e vozes sampleadas de ‘Deus e o Diabo na terra do sol’, de Glauber Rocha. Demais.
Liminha, mesmo sem produzir, toca baixo em quase todas as faixas. Participação especialíssima. Na faixa seguinte (‘Etnia caduca’) desenvolve uma linha muito legal.
‘Distante demais’ apresenta a face lírica, de belíssimas canções e letras lindas. Co-autoria de Dudu Falcão.
Na seqüência vem a faixa-título, com a idéia original que a paz surgiu aqui na terra, mais especificamente no morro, pois ‘vive perto do espaço sideral’. ‘Essa coisa de riso e de festa só tem aqui’. Mais uma com uma mistura de pandeiro, sons eletrônicos, um violãozaço e outros ruídos. Funciona muito bem, principalmente porque as canções são excelentes composições, que funcionariam mesmo só com voz e violão. Mas Lenine capricha no aspecto mais essencial da música, o Som.
Em ‘A balada do cachorro louco’, mais uma vez Lenine brinca com suas vozes, canta e contra-canta, dobra e se multiplica, com uma bateria reta sobre uma música tipicamente nordestina, com pifes do Carlos Malta. Mais uma que se ouve com muitos mais detalhes no fone de ouvido, que ainda vai me ensurdecer...
Segue ‘Aboio avoado’, só na voz, ‘um aboio para trazer de volta ao curral as paixões que se desgarraram’.
‘Dois olhos negros’, música sobre uma mulher, pop, redondinha, dançante e divertida, uma letra meio Carlinhos Brown, um violão tipicamente bem tocado. Essa foi até pra alguma novela. Termina com um solo curto e hendrixiano do Fernandinho Vidal.
‘O marco marciano’ destoa não pela qualidade, mas por ser totalmente acústica, com voz(es) e viola de 10 cordas. E a letra nada tem de regional, misturando ficção científica, paisagens amplas, tom épico e outras cositas más.
Vozes percussivas, uma guitarra com timbre estranhíssimo, uma bateria de fundo. Falando assim não deveria combinar. Mas depois começa a música, com aquele violão, vozes, uma baixo subterrâneo do produtor Chico Neves e vários saxofones. ‘Que baque é esse?’, ele se pergunta. Eu me pergunto também, mas que porra é uma guitarra Chelpa??
Segue um pout pourri com 4 músicas, amarradas pelo violão e pandeiro: ‘Pernambuco falando para o mundo’, ‘Voltei Recife’, ‘Frevo ciranda’, ‘Sol e chuva’ e ‘Rios pontes e overdrives’ do genial e saudoso Chico Science e Fred Zero Quatro (do mundo livre s.a.).
‘Bundalelê’ é o lado carnavalesco e carioca do disco, inclusive gravada com o bloco Suvaco de Cristo.E vamos nos despedindo com ‘Mote do navio’, com um coral de várias vozes e agradecimentos em profusão. Nem precisava, Lenine, nós é que agradecemos!

Nenhum comentário:

Postar um comentário