Já que o Mateus pediu...continuamos na delicadeza por aqui.
Este aqui não é tão delicado como o anterior, já resenhado aqui, 'O cair da tarde', mas também compará-los é burrice minha.
É um disco lindo, onde mais uma vez o intérprete Ney traz vários autores para seu garimpado repertório.
O disco conta com muitos músicos da melhor estirpe, só pra citar alguns (fora os citados abaixo): Marcos Suzano, Leandro Braga, Zé Nogueira, Marcio Montarroyos, Arthur Maia, Serginho Trombone e por aí vai...
'Miséria no Japão' já tinha aparecido no disco do Pedro Luís e a Parede, se não me engano. mas vale o bis numa voz de verdade, né? PLAP é muito legal, mas falta um cantor de verdade...
Letra primorosa, refletindo sobre a percepção sobre riqueza e pobreza:
"Quem te disse que miséria é só aqui?
Quem foi que disse que a miséria não ri?
Quem tá pensando que não se chora miséria no Japão?
Quem tá falando que não existem tesouros na favela?
A vida é bela
Tá tudo estranho
É tudo caro
Mundo é tamanho"
Na seqüência, uma do Paulinho Moska, 'Gotas de tempo puro', mais uma bela letra numa canção pop redondinha, com uns sopros bem bonitos e coloridos.
"Choveu dentro de mim
Gotas de tempo puro
Trovoadas de passado
Relâmpagos do futuro
(...)
O que a humanidade grita é
Eu quero a liberdade, é lógico
Mas o que a natureza ensina
É que nada tem que ser cronológico"
'Vira latas de raça' é uma boa surpresa por seus autores (Rita Lee e Beto Lee, que tocou outro dia com os Mutantes e inclusive tem um disco a ser resenhado por aqui que o Mateus vai gostar de ouvir), além de ser mais uma boa canção com um pezinho na latinidade a la Santana pelo Ricardo Silveira (que também é responsável por vários arranjos), com letra citando o tropicalismo.
"Não posso ser outra coisa se não James Dean
Eu sempre fui mais bonzinho quando sou ruim
Minha dor não dói, sou marginal, sou herói!"
'Novamente' (do conterrâneo niteroense Fred Martins e de Alexandre Lemos) é das mais bonitas do disco, uma sonoridade delicada e etérea, com uma percussão suave.
"Quem sabe o que se dá em mim?
Quem sabe o que será de nós?
O tempo que antecipa o fim
Também desata os nós
Quem sabe soletrar adeus
Sem lágrimas, nenhuma dor
Os pássaros atrás do sol
As dunas de poeira
O céu de anil no pólo sul
A dinamite no paiol
Não há limite no anormal
É que nem sempre o amor
É tão azul"
'Chance de Aladim' (Luli) é suave, lenta, cheia de espaços. Uma das melhores letras do disco, mas grande, vá ouvir e preste atenção!
'Poema' tem uma origem curiosa, com a letra de Cazuza (parece que feita para a sua avó por ocasião de seu falecimento) musicada postumamente pelo Frejat (que também toca e programa loops por aqui!). Linda música sobre pequenas mortes cotidianas, internas e externas.
"De repente a gente vê que perdeu
Ou está perdendo alguma coisa
Morna e ingênua
Que vai ficando no caminho
Que é escuro e frio mas também bonito
Porque é iluminado
Pela beleza do que aconteceu
Há minutos atrás"
Chegamos a mais um dos pontos altos, 'Olhos de farol' (Ronaldo Bastos e Flávio Henrique), sendo que esta poderia estar no anterior 'Cair da terde', com seus arranjos quase eruditos e voz baixa. Mais uma linda.
'Depois melhora' (Luiz Tatit) é tranquila e triste, poucos instrumentos, com delicadeza, como agrada ao Mateus...o disco não tem músicas ruins, nem pontos baixos!
"Sempre que alguém daqui vai embora
Dói bastante mais depois melhora e com o tempo
Vira um sentimento que nem sempre aflora mas que fica na memória"
'Mais além' (Lenine!, Bráulio Tavares, Lula Quiroga, Ivan Santos) é sensacional! Cordas majestosas, dinâmica inteligente, letra viajante, piano belo, muitas coisas boas numa canção ótima. O curioso pra mim é que a música sempre tocava num seriado da Globo (com médicas incluindo a Patricia Pillar), mas a voz nunca entrava e eu ficava querendo saber de quem era. Tempos pré google que não voltam mais.
Aqui a voz do Ney se sobressai.
"O homem sobre a areia como era no início
Roçando duas pedras, uma em cada mão
Descobre a fagulha
Que incendeia o paraíso
E imaginou que havia inventado Deus
É mais, é mais, é mais, é mais, é mais além
(Mais além)"
'O som do mundo' (dos Skanks Samuel Rosa e Chico Amaral) é popzinho agradável reggae, talvez umas das menos boas.
'Fazê o quê' (mais uma do Pedro Luís) tem cara de sertanejo, viola e voz meio repente, mais uma boa surpresa.
"Se tem Hermeto, Bispo, Marley, Gentileza
Isso só me dá certeza
Da nobreza que dá certo
Vô fazê, vô fazê
Música pra enriquecer (o quê?)
Os corações e o planeta
Basta um papel e uma caneta"
E estamos chegando ao fim...'Bomba H' (Alzira Espíndola e Itamar Assumpção) não deixa a qualidade diminuir.
'A cara do Brasil' (Celso Viáfora, Vicente Barreto) já foi citada num blog do Paulinho, pela letra que, entre outras coisas que definem o Brasil, aborda o futebol. Meio circense e divertida, apesar de séria.
"A gente é torto igual Garrincha e Aleijadinho
Ninguém precisa consertar
Se não der certo a gente se virar sozinho
decerto então nunca vai dar
(...)
Brasil Mauro Silva, Dunga e Zinho
que é o Brasil zero a zero e campeão
ou o Brasil que parou pelo caminho:
Zico, Sócrates, Júnior e Falcão"
E aí, qual é o seu Brasil???
Dois olhos negros...
ResponderExcluir[ANDRÉA]
Não conheço o disco completamente, mas muitas de suas músicas que apareceriam num 'ao vivo' logo em seguida... Mas em matéria de delicadez, Mey costuma ser imbatível...
ResponderExcluirImagino que agora nosso cronista deve estar se coçando em síndrome de abstinência de caveiras, esqueletos e tudo o mais: aguardem-no!
[M, de medo...]
Ah! Esqueci de falar - PLAP é legal mesmo! Dão, você podia fazer uma resenha deles ein?
ResponderExcluir[ANDRÉA]
Ney lançou um disco ao vivo que o repertório é quase o mesmo.
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