segunda-feira, 25 de julho de 2011

Tropicália 2 - Caetano e Gil (1993)


A Tropicália foi um movimento artístico ímpar na cultura brasileira - não só por ter expressado uma nova atitude perante à política, a moral e ao corpo, mas porque soube fazer tudo isso de um jeito diferente. Os tropicalistas inventaram uma nova estética: misturaram plástico à miçanga, guitarra ao berimbau, Coca-Cola à Brigitte Bardot. A cena musical brasileira em 1968 foi se tornando cada vez mais polivox: conversavam o velho e o novo, e o Brasil com o mundo.


Em 1993, a Tropicália completou 25 anos e os dois pop-tropicalistas Caetano e Gil comemoram fazendo o que fazem muito bem: música! Se uniram ao Liminha, tropicalista histórico da primeira hora na produção e, juntos, foram costurando um novo projeto que tinha a ver com o passado, mas que também tinha muito a ver com o que a Tropicália tinha feito de todos eles. Como se a criatura estivesse sendo engolida pela boca do criador.


O cd abre com “Haiti” – rap em baixa velocidade, violoncelo de Moreno e percussão de Ramiro Mussoto se misturam à história lado B do Haiti. E na música, estórias vão se cruzando com questões raciais que não se apagam com o tempo, a outras estórias, e a sensação que nos resta é a de que não precisamos ir até ao Caribe, que o Haiti, é aqui. O Haiti não é aqui.


“Cinema Novo” é uma obra de arte. O cinema como fonte de inspiração para a Tropicália. A tela era um lugar, onde sem dúvida, se estabelecia “outras conversas sobre os jeitos do Brasil”. E num balanço delicioso, alegre, a música vai contando a estória do impacto do cinema na música. É a pororoca entre as duas artes: “as imagens do país desse cinema entraram nas palavras das canções”. Cinema Novo, o novo Cinema Transcendental.


“Nossa Gente” e “Cada macaco no seu galho”, bahianíssimas total. É o carnaval que corre nas veias e escorre desses dois baianos. A primeira do Olodum, dona da melhor frase do ano : avisa lá que eu vou chegar mais tarde! E segunda do Riachão, com a participação do Carlinhos Brown, engrossando a presença soteropolitana no cd.


O som negro roquenrrol de Jimi Hendrix era ouvido adoidado pela trupe tropicalista no apartamento paulistano, entre móveis de acrílico coloridos, onde morou Caetano entre 1967 e 68. Influência fundamental na Tropicália, Jimmi Hendrix não poderia faltar em “Tropicália 2”. “Wait until tomorrow”: leitura suingada, abrasileirada, com a presença mais uma vez da turma de Carlinhos Brown e de Nara Gil.


“Tradição” é uma das minhas músicas favoritas do Gil. É uma música que traz coisas da Bahia, um sentimento do lugar, mesmo pra quem nunca tenha vivido lá… Traz também o desabrochar de uma personalidade. É um menino que olha para uma menina, mas acaba observando que o rapaz que estava com ela era diferente de tudo que ele tinha visto até então. Uma coisa meio rock’n’roll, com calça americana. “Tradição” conta a estória de um projeto de ser um homem diferente, que acaba sendo mais importante do que ter aquela menina. O lindo na música é o interesse e a identificação pelo diferente.


“As coisas” a lindíssima de Arnaldo Antunes, além de mais suave na voz de Gil e Caetano, ganha também uma batida mais rock com as brincadeiras de Pedro Sá na guitarra e Liminha no baixo. Gosto especialmente da inclusão da aguda “As coisas”. Essa escolha é mais uma prova da intenção polivox tropicalista.


“Baião Atemporal”, gravada em Los Angeles, é quase uma oração para Tom Zé. De Irará para o mundo.


“Tropicália 2” é uma metamorfose feita em tom de festa. É o encontro com a necessidade de Caetano Veloso em esticar a palavra e seu sentido até a explosão, com a natureza aventureira e livre de Gilberto Gil …

[ANDRÉA]

3 comentários:

  1. Excelente resenha!
    E serve ainda para nos lembrar que ainda está faltando Tropicália original nesse blog...
    Paul

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  2. Bela resenha,o ultimo parágrafo então,matou a pau.

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