Há uns meses, fuçando na internet tive a grata surpresa ao me deparar com um grupo que até então não conhecia: Mula Manca & a Fabulosa Figura. Não sei se foi a capa surrealista ou o nome quixotesco, mas o fato é que algo me chamou atenção e resolvi escutar uma música. Gostei e passei a escutar outras até decidir baixar o disco inteiro e fiquei animado com a descoberta pessoal.
No mesmo dia, apresentei a novidade para a Carol, minha namorada, com um leve receio de que ela, com maior rigor, se decepcionasse. Entretanto, não só isso não ocorreu, como ela se tornou rapidamente fã do disco, mais até do que eu.
Depois, pesquisando, descobri que se tratava de um quarteto Pernambuco (mais uma grata surpresa musical de lá) formado por Tibério Azul (voz, violão e canções) e Castor Luiz (voz, piano e canções), Dom Angelo (guitarra) e Bruno Cupim (percussão) e que Amor & Pastel, o disco em questão, era o 2º e foi lançado em 2007. No primeiro trabalho em 2004, a banda atendia pelo nome de Mula Manca & a Triste Figura.
Reparando bem, o Amor & Pastel apresenta, em sequencia, uma espécie de trilha sonora de um casal em crise. Começa com uma quase MPB “Se Lavo, Lavu”, com a voz masculina de Tibério Azul interpretando a esposa abandonada, tal como Chico Buarque em diversas canções. Em seguida, a bilíngue “Blond Girl”, que conta inclusive com um piano ao melhor estilo bossa nova para retratar a fossa do momento de crise:
No meu carro uma bossa
Um poça que tu gosta
Uma frase meio torta
Uma barriga em meu violão
Uma, duas luas
Uma cachaça, dois coração
Outro par me convidou...para dançar do lado de lá...eu vou. Em “Outro Par” surgem os primeiros sinais do desgaste da relação ao ritmo de um excelente samba de raiz, emendando em “Dinheiro” (uma das minhas preferidas), cuja letra criativa mexe com o imaginário da vida boa de um cara após ganhar dinheiro e esnobar a antiga paixão:
Paris! Europa! Chile! Argentina!
Girafas! Caribe! Charutos!
Hula - Hula! Baralho! Loiras!
Piscina na cobertura!
Massagem, passagem, uma bela paisagem!
Ah, você só vai olhar!
Com uma levada dos tempos do Iê-Iê-Iê, a introdução de “Dinheiro” remete muito à recente “Invejoso” de Arnaldo Antunes. Antes que surjam especulações maldosas, importante dizer que essa música do Mula Manca & a Fabulosa Figura é mais antiga.
“Loteria” vem em ritmo de samba com bossa e o piano volta ter uma participação na curta “Escravo”, onde a crise do casal apresenta-se em sua plenitude: Preciso me humilhar ... E ser só coração...Ou levá-lo numa bandeja...Pra ver se você se comove.
Refletindo a sopa de sentimentos pós-separação, vem “Fórmula 1”: Leio as notícias no jornal...são iguais...Faço um chá pra nós dois..você se foi.. Mas hoje me deu uma sensação... um sentimento de grandeza... uma vontade de dizer...voe voe voe querida..voe voe voe meu bem.... Trata-se de um som que remete ao tempo da jovem guarda. Se fechar os olhos, até a voz lembra o bom e velho Tremendão em mais uma letra divertida e até surrealista.
O céu testemunhou... Cecilia aquela flor...Não murcha, parece que se apetece...Esta cada vez maior cá em mim . “Cecília” começa com letra e sons tristes, mas traz também boas recordações em ritmo alegre dentro da mesma canção:
Aí me recorda,
aquela história da gente dançar como um par
O mesmo baile, eu no mesmo traje e teu vestido insiste em rodar
Juras e beijos, abraços, um regaco escondido pra noite durar
O teu sorriso, cabelo comprido, um adorno com a flor no lugar
Deita aqui...Eu arrumei a cama pra nós dois...Esquece tua mala aí, aqui.... Em “Deita aqui”, uma voz feminina numa canção suave reflete a busca pela reconciliação. O diálogo entre o casal continua depois em ritmo de forró pé-de-serra com “Animal”, afinal sou o mesmo rapaz de cabeleiras longas. Música sensacional.
A trilha da história segue com dois sambinhas “Terra, Água e Sal” e “Paletó”, que retrata brilhantemente a nostalgia que surge após a separação consolidada:
Pouco me tem interessado ultimamente
É que a saudade manda mensagem súbita
Você não está pra me fazer um cafuné
E a leveza já precisa ser
Aos sons de passarinho e com uma bela levada, em "Varanda" a esperança renasce...ainda que sob a incerteza:
Não fique triste, me promete
Que se derrete quando eu voltar
Se eu voltar (...)
O ritmo acelera em “Pé no Chão” com uma letra quase surrealista para encerrar em clima de suspense com “Arrepio”.
Enfim, não sei se foram as múltiplas influências, a alternância entre tropicália, mpb, jovem guarda e mangue beat, ou ainda as letras bem humoradas, mas o fato é que Mula Manca & a Fabulosa Figura me conquistou definitivamente e esse disco transformou-se numa deliciosa trilha sonora do último verão, quando ao lado da Carol, passávamos tardes ensolaradas tomando cervejinha na piscina de brinquedo. A diferença é que, ao contrário do enredo do disco, o clima dominante era de plena harmonia. Valeu Mula Manca! Esperamos ter a oportunidade de ouvi-los em algum show futuramente.
Paul
Obs: para conhecer o trabalho deles, www.myspace.com/mulamanca
É só comigo, ou mais ninguém está vendo a capa do disco? [M]
ResponderExcluirMateus..eu estava vendo, mas desconfio que era pq a imagem estava pesada. Troquei por outra mais leve. Veja se agora consegue
ResponderExcluirPaul
agora também estou vendo...
ResponderExcluir[ANDRÉA]
Paul, acabo de reler essa tua resenha. Pô, ela tá bonita demais...
ResponderExcluirEscreva sempre...
[ANDRÉA]
Quero baixar os dois discos, eh tinha mas acabei perdendo, acompanho a banda há mais de 10 anos. Se alguém puder me ajudar serei eternamente grato!
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