“Naquele
Brasil antigo / Perdido no desengano / Seu Cabral chegou nadando
E não preocupou com nada / Deu ordem à
rapaziada / Mandou varrer o terreiro
"Me chame o pai do chiqueiro / que
hoje eu quero forró, / Toré, samba, catimbó / Que eu já virei brasileiro-ô-ô-ô..."
Mealembro vagamente das comemorações dos 500 anos de
descobrimento do Brasil. A ideia era de festa, mas o pau comeu e houve
protestos em muitos locais e ocasiões. Hum, vejamos nós aqui que esse negócio
de povo festeiro, sem consciência sóciopolíticaeconômica que 14 anos depois surpreende
os fãs do megafutebol patrocinado pela tal de FIFA já aflorava...
Eita disquinho bom esse segundo do
Mestre Ambrósio (que segundo o Wikipedia
é banda de manguebeat?)! Banda
efêmera, átimo, como diria nosso tamborista zé tatu. Três discos e se acabou. O
primeiro saiu independente. Mais forte no conteúdo que na produção, algo que
neste segundo já é aprimorado.
Vimos o Mestre aqui num mês frio qualquer
em Curitiba (surpresa?), no antigo forró do vasquinho. Palco pequeno, quase de
colégio. A plateia se espalhava pela (ex-)quadra poliesportiva do (ex-)clube.
Nos cantos, vendia-se cerveja, caldinho de feijão e mocotó. Calamengau era uma espécie de nome
coringa, aplicava-se ao espaço e a banda anfitriã da casa. Se não me engano,
criada e gerida pelo “Ceará” que vi tocar sanfona com a camisa do Santa Cruz,
vai entender (bem, pode ser minha memória que me apunhala pelas costas).
Oh-oh, sim, o disco! Mestre
Ambrósio é, ou era neste disco, principalmente Siba (rabeca, guitarra, voz, letra
e música). Siba não é de muita concessão, se arrepiaria torcendo o nariz para o
supra-citado verbete da wiki. Siba
curte mesmo é o som do interior de Pernambuco, do nordeste, música matuta (como
atesta a autobiográfica Pé-de-Calçada).
Forró pé-de-serra calçado na sua rabeca, já veja aí a diferença. Mas, a parte
estas questões sociológicas, antropológicas, musicológicas ou outras lógicas
quaisquer (das quais eu só começo a entender depois da terceira ou quarta
ampola), a música deles é boa pra cacete! Siba tem um vozeirão potente, toca(ava,
pelo menos no Calamengau) uma Gibson
SG cristalina e tinha essa coisa de “forrabeca” que eu nunca tinha ouvisto antes.
A faixa que dá nome ao disco, por exemplo, é a sua cara.
Mestre Ambrósio aproveita a oportunidade
de, dispondo de melhor estrutura refazer três temas do álbum de estreia. Pessoalmente,
não penso que tenha sido essencial. Mas o Mestre não é só Siba. São três
percussionistas, Éder “o” Rocha, Sérgio Cassiano (que também dança e canta, num
timbre e estilo completamente diferente de Siba), Maurício Alves e
eventualmente Helder Vasconcellos (que também empunha o fole de 8 baixos) e
mais o baixista Mazinho Lima. A formação pode sugerir algum paralelo com a
Nação Zumbi, mas a realidade passa looooonge. Apesar da inclinação regionalista
do conjunto, o som é mais variado (mesmo sem incluir o óbvio rock) e a
percussão acompanha.
Neste Fuá
destacam-se ainda Sêmen (Como posso
saber de onde venho/ Se a semente profunda eu não toquei?), Pescador
(Já faz tempo que eu sai de casa / Pra viver no mar), Os Cabôco
que homenageia o carnaval de Olinda, e Chamá Maria (Toda noite é assim / Toda festa é assim / ... / Um brabo bate, um mole apanha / E o
pagamento é que é ruim / ... / O fole emperra, a voz arranha / Eita, pisada sem fim!).
Ainda sairia um ótimo Terceiro
Samba, menos Siba e mais Hélder e Sérgio Cassiano, e depois disso Siba se
mandou para a Fuloresta e eu perdi o
contato. Enquanto isso, o tempo passou e nada ficou mais atual que a última
estrofe do Fuá:
Mas na hora
da verdade
Quando passou a cachaça
Seu Cabral sentou na praça
Caiu na reflexão
Disse: "Esta situação
sei que nunca mais resolvo!"
Então falou para o povo:
"Juro que me arrependi
o Brasil que eu descobri
queria cobrir de novo!"
[M]
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